domingo, dezembro 31, 2006

PABLO NERUDA - AS UVAS E O VENTO


"Adiante!"
Pablo Neruda
URSS,
China
Repúblicas
Populares,
oh mundo
socialista,
mundo
meu,
produz,
faz árvores, canais,
arroz, aço,
cereais, usinas,
livros, locomotivas,
tratores e gados.
Tira do mar teus peixes
e da terra rica as colheitas
mais douradas do mundo.
Que lá das estrelas
se divisem
Brilhando como minas descobertas
teus celeiros,
que trepidem os pés no planeta
com o ritmo de ataque
das perfuradoras,
que o carvão de seu berço
saia num grito vermelho
rumo às fundições eminentes,
e o pão diário
se desborde,
o mel, a carne
sejam puros oceanos,
as rodas verdes das maquinarias
se ajustem aos eixos oceânicos.
Busca sob a neve,
e na altura,
que tuas asas de paz deslumbradora
povoem de música motorizada
as últimas esferas
da pátria celeste.
Eu habito
no mundo do ódio.
Querem
Que um vento horrível destrua as colheitas.
Que não se reincorporem tuas cidades.
Querem
que rebentem teus motores
e que não cheguem pão nem vinho
às múltiplas bocas de teus povos.
Querem negar-te a água,
a vida, o ar.
Por isso,
homem do mundo socialista, assume,
assume sorridente,
coroado de flores e de usinas,
erguido sobre todos
os frutos deste mundo.

2 comentários:

Anônimo disse...

Eras a vida.
(Pablo Neruda)

Pelas ruas de Praga
tua figura,
não porém um deus alado,
mas o pálido rosto perseguido
que depois da morte nos sorri.
O herói que não levava
em sua cabeça imóvel
os lauréis de pedra esquecida,
mas um chapéu velho
e no bolso o último
recado do Partido,
o clandestino da meia-noite
e a aurora organizada
a circular que marcha
com sua tinta fresca,
e assim rua após rua
Fucik, com suas instruções,
Fucik, com seus folhetos,
com teu velho chapéu, sem orgulho
nem humildade, temperando
as armas da resistência
e andando para a morte
com tranqüilidade do transeunte
que deve vê-la na próxima esquina,
pelas ruas de pérola antiga
do inverno de Praga,
enquanto o inimigo no castelo
ladrava a sua matilha,
de uma rua até outra rua
organizavas
de teu povo a unidade, a vitória
que hoje coroa a paz de tua pátria.

Viva ao maior poeta da américa Latina!!
Viva ao poeta do socialismo, do povo!!!

Anônimo disse...

Índia, 1951.

Na Índia
de novo,
outra vez
o aroma
de frutas mortas, o
grasnido
de corvos.
Senti que se oprimia
dentro de um vaso quebrado
meu coração, ouvi
passos,
passos que morreram,
passos.

Ramagem
de raças e de túnicas,
Índia,
materna, entrelaçada,
angusta, cruel, remota,
eras a mesma.
Os grandes rios sepultando corpos,
a cor de açafrão nas colinas,
mas agora
não era a minha juventude, minha solitária
adolescente vagante.
Agora
as flores me esperavam,
caíram no meu colo
e um nome,
uma carta,
uma simples sílaba
vinha
lá do cárcere para reconhecer-me.

Terras de Telenghana,
Mártires, criaturas
Colhidas entre
dois fogos,
as metralhadoras do governo,
os cárceres
do Nizam de Hyderabad.
Camponeses caídos
nas que já creram
terras suas,
agora
com parlamento próprio,
sem ingleses,
e a velha miséria,
a fome
ululando nas aldeias.
Esperando,
Esperando
sempre viveu a Índia,
sentada
junto ao rio do tempo,
esperando.

Passavam os guerreiros
de pés ensangüentados,
os príncipes
comedores de perolas,
os ingleses
impassíveis
os sacerdotes frios
como sáurios,
estudando o umbigo
da terra e do céu,
todos
devorando-te algo,
passageiros, piratas, mercenários,
e tu, mãe do mundo,
sentada junto ao rio
do tempo
fiando e esperando.

Agora
os poetas
Sidard Jaffris ou outro,
o magro ou o barbudo,
saiam do cárcere.
A poesia
na Índia
entrava no calabouço,
saia e regressava,
aprendendo
a liberdade entre os prisioneiros,
conhecendo
as penas,
os dialetos, as dores,
as palavras secretas
dos ensimesmados camponeses
a queixa dolorosa,
as abertas feridas,
a doçura rebelde
que avançam levantando seu estandarte
de estrelas e pombas.


Útero da terra, território
fechado em que fermentam
as uvas da história.
Antiga irmã
dos velhos planetas,
eu soube agora,
escutando os cantos nos povoados,
as iras debulhadas,
os punhos no vento,
soube
que se levantarão suas estaturas,
que se acumulará teu poderio,
que darás a teu povo
o pão que lhe negavas,
e que já não veremos
passar detrás do ouro,
cruzar detrás do rito
deslumbrador da teogonia,
a fome com sua escova
varrendo pobres ossos e sujeiras
no lado do caminho.

Índia, levanta
tua juventude, incita
teu relógio para marcar a hora que vem.
Adianta-te e colhe
No horário o alto meio-dia
São antigas tuas flechas.

Sobe-as à tua testa
e crava no horário teu destino.

Pablo Neruda (As uvas e o vento)